Hoje vamos falar da definição de saúde na medicina chinesa. Mas primeiro, vamos explicar o que ela não é.
Nem ausência de doenças, nem completo bem estar
Saúde não equivale à “ausência de doenças”, como na visão biomédica mais convencional. Esta definição indica como, durante muito tempo, a medicina cartesiana foi mais uma ciência da doença do que uma ciência da saúde, pois não manteve o foco no que caracteriza um organismo como saudável, nem como preservar essa condição. Em vez disso, representava-se por meio de uma linguagem de “guerra contra a doença”, principalmente as doenças contagiosas. Nos últimos cem anos, houve uma certa redução das doenças infecciosas como causa de morte. Ao mesmo tempo, predominam as doenças crônicas, metabólicas e degenerativas. Por isso, a medicina convencional tem sido forçada a rever este ponto de vista.
Outra definição, elaborada pela OMS, descreve saúde como um “estado de perfeito bem estar físico, mental e social”. Embora mais ampla e positiva, esta definição tem sido questionada por separar conceitualmente o que é inseparável na vida. Pois, ninguém é só corpo, só mente ou só membro de uma sociedade. Somos tudo isso ao mesmo tempo. E, além disso, essa definição é excessivamente idealizada. Afinal, em que situação no mundo real poderíamos estar por muito tempo em um estado de “perfeito bem estar”? Isso se parece mais com o paraíso dos monoteístas, o nirvana dos budistas, os reinos dos imortais taoistas, ou uma experiência de êxtase religioso ou erótico. Mas não é algo viável o tempo todo.
Saúde segundo a medicina chinesa
Para a medicina chinesa, saúde é autorregulação e equilíbrio dinâmico do nosso organismo. Nosso corpo está constantemente fazendo o que é necessário para viver: respiração, circulação sanguínea, digestão, metabolismo, movimento voluntário, processamento cognitivo, sensorial e afetivo, etc.
Quando tudo funciona adequadamente, temos a capacidade de nos autorregular em relação a variações climáticas, calor, frio, vento, secura e umidade. Nosso sistema imunológico responde à invasão de agentes patogênicos. O corpo desempenha suas funções necessárias à vida de modo eficiente. Sentimos emoções ao passar pelos acontecimentos da vida, mas sem perder a cabeça e sem nos fixar neste ou naquele acontecimento. As coisas passam e nos adaptamos às mudanças da vida.
Na linguagem da medicina chinesa, saúde é equilíbrio de Yin e Yang e dos Cinco Elementos. Isso se traduz como equilíbrio funcional, plenitude da vitalidade e equilíbrio emocional.
Assim, uma pessoa saudável pode vir a se machucar ou adoecer, mas seu organismo tem suficientes recursos e capacidade de autorregulação para se recuperar destas situações. Os ferimentos cicatrizam e ela se cura das infecções. Ela respira, digere, movimenta-se e dorme bem. Não tem doenças crônicas, ou pelo menos elas estão controladas, sem crises frequentes. É capaz de manter relações sociais sadias e manejar os conflitos inevitáveis. Suas faculdades mentais estão plena e ela mantém o equilíbrio emocional em situações adversas.
Nutrir a vida
E para expressar que saúde é uma capacidade que se cultiva, uma das expressões em chinês para saúde é “nutrir a vida” (養生 yǎng shēng). E para que todas nossas funções orgânicas e faculdades mentais funcionem na sua plenitude, a civilização chinesa desenvolveu todo um repertório de práticas corporais para favorecer a preservação da saúde e a obtenção de uma longevidade saudável. Produziu também uma atenção global ao estilo de vida, considerando alimentação, exercício e qualidade do sono como bases para a saúde. E outro ponto importante é o devido equilíbrio entre repouso e atividade, outra forma de falar do equilíbrio de Yin e Yang. Veremos este tripé da saúde em uma outra postagem.