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Esta é a página do blog Saúde Integral. Nela, você encontra nossas publicações. O objetivo é trazer discussões atuais e relevantes sobre saúde, com contribuições da medicina chinesa e da psicologia. Publicaremos artigos regularmente, sempre que possível, também com versão em vídeo, em parceria com o canal Longevidade Taoista do Youtube. Se você já nos segue nas redes sociais, pode sugerir temas para futuras postagens.

Longevidade com saúde

a expressão em chinês significa longevidade

Hoje vamos falar de longevidade. É um erro comum imaginar que velhice é necessariamente igual a doença . Especialmente para a medicina chinesa, é possível e desejável ter longevidade com saúde.

versão em vídeo no canal Longevidade Taoista

Vamos primeiro definir longevidade. Idealmente, uma vida longa, na estimativa da civilização chinesa, é o pleno potencial de duração de uma vida humana, 100 anos ou mais. Em um texto clássico, como o Clássico Interno do Imperador Amarelo (Huángdìnèijīng 黃帝內經) esta preocupação já aparece no seu primeiro capítulo:

“As pessoas da alta antiguidade, que conheciam o Tao, seguiam as leis de Yin e Yang, em harmonia com a arte dos números, comiam e bebiam o que havia nas estações, a vida diária tinha constância, não trabalhavam em excesso, assim conseguiam que corpo e espírito se unissem, e chegavam ao fim do limite natural de suas vidas,  passando de cem anos ao morrer” [minha tradução] (Huangdineijing, Suwen, cap. 1).

Aqui, o limite natural de suas vidas, (em chinês, tiān nián 天年), é o tempo que viveríamos se nossa vida não fosse interrompida por alguma tragédia, ou encurtada por nossos descuidos com a saúde. Na citação, vemos uma receita de longevidade, que vamos explicar agora.

A receita de longevidade com saúde do Imperador Amarelo

Primeiro, a “pessoas da alta antiguidade” pertencem uma época lendária, antes dos registros históricos escritos. Pois o próprio Imperador Amarelo teria vivido por volta de 2600 a.C. . Então, o começo da civilização chinesa é o modelo de longevidade com saúde , quando as pessoas ainda viviam em harmonia com a natureza.

“conheciam o Tao, seguiam as leis de Yin e Yang, em harmonia com a arte dos números”

Isto significa que compreendiam os ciclos naturais do dia e das estações do ano e faziam suas atividades em harmonia com estes ciclos. Por exemplo, descansavam à noite e trabalhavam de dia. Veremos a relação entre os horários e as atividades em uma futura postagem. Como viviam de caça e pesca, agricultura e pecuária, observavam as características das estações e ajustavam suas atividades a elas: as épocas certas de plantar e colher, caçar e pescar, dormiam e acordavam cedo, protegiam-se das intempéries.

“Comiam e bebiam o que havia nas estações”

Outro ponto importante, é a alimentação saudável. Estas pessoas comiam o que obtinham da terra, ou seja, as frutas, verduras, legumes, grãos e carnes disponíveis naquela época do ano. Não havia congelador nem importação de alimentos, sem falar de processamento industrial da comida.

“A vida diária tinha constância”

Além disso, suas vidas tinham um ritmo harmônico. Hoje sabemos que um horário regular (para dormir e acordar, fazer as refeições e outras atividades diárias) é um fator de saúde. Não precisa ter a rigidez do horário mecânico do relógio, porque há pequenas variações em função da época do ano. Por exemplo, nascer e o por do sol mudam, a duração do dia, também.

O próximo ponto, “não trabalhavam em excesso” é extremamente importante nestes nossos tempos de síndrome de Burnout, fadiga crônica e morte súbita por excesso de trabalho. Como vimos antes [inserir link para a visão de saúde], saúde é equilíbrio de Yin e Yang. Aqui, o Yin representa o descanso, o Yang, o trabalho.

“Conseguiam que corpo e espírito se unissem”

Por fim, esta é uma referência indireta a exercícios meditativos, típicos da tradição taoista. Unir o corpo e o espírito pode ser interpretado como efeito referência à prática de “guardar a unidade” (守一 shǒuyī), a expressão mais antiga nos textos clássicos para falar de meditação. Cultiva a serenidade, além de prática espiritual, é um método para longevidade com saúde.

Resumindo

Combinando estes pontos-chave, obtinham longevidade com saúde. Quais são eles?

  1. Conhecer e estar em harmonia com os ciclos naturais;
  2. Comer e beber o que está naturalmente disponível nas estações;
  3. ter uma rotina diária bem organizada, que integra os pontos 1 e 2;
  4. Não se exceder no trabalho.
  5. Praticar regularmente exercícios suaves e meditativos, para “nutrir a vida” (yǎng shēng 養生).

E é assim que “chegavam ao fim do limite natural de suas vidas,  passando de cem anos ao morrer”.

Será possível fazer isso nos dias de hoje?

Você pode se perguntar: mas, e hoje, como isso se aplica? Afinal, não estamos mais nos tempos antigos ou “pré-históricos”. Agora temos luz elétrica, alta tecnologia, sociedade de consumo, divisão social do trabalho típica do capitalismo tardio e, em consequência disso, vários novos problemas, inclusive de saúde.

Pois bem, isso se aplica a nós com inteligência e sensibilidade. É verdade que vivemos em outra época e contexto cultural, mas as lições essenciais continuam válidas. Isto é, se queremos ter longevidade com saúde.

Como isso se aplica à vida contemporânea

Para ter longevidade com saúde, precisamos corrigir alguns erros do estilo de vida contemporâneo, que nos fazem adoecer, principalmente de doenças crônicas e metabólicas, encurtando a duração natural de nossas vidas.

Ritmo de vida e ciclos naturais

Quando não respeitamos as condições climáticas, o ritmo natural de dia e noite, as variações de luminosidade e temperatura que vem com as mudanças das estações, certamente vamos nos prejudicar.

Alimentação equilibrada e exercício

A mesma coisa vale para o excesso de alimentos industrializados, com aditivos nocivos à saúde (conservantes, realçadores de sabor, e muitos outros), e também para a dieta desequilibrada (pobre de nutrientes e rica de açúcar e gordura) que, por ser mais barata e saborosa, torna-se predominante. Temos um aumento de doenças crônicas e metabólicas hoje que poderia ser significativamente contido com mudanças de estilo de vida, incluindo alimentação mais saudável e exercícios moderados.

Reparem que o Imperador Amarelo menciona só indiretamente a prática de exercícios. Afinal, isso só é um problema para a população urbana e sedentária. Quem vivia na roça, na mata, tinha muita oportunidade diária para se movimentar, não precisava parar para fazer ginástica. Já trabalhava a terra, cuidava dos animais, carregava água, rachava lenha, construia a própria casa e fabricava seus utensílios e ferramentas. Mesmo nas cidades antigas, as pessoas comuns tinham que se deslocar a pé e mover o corpo nos seus afazeres diários.

Excesso de atividades, estímulos e trabalho

Além da má alimentação, também o excesso de atividades e estímulos perturba a rotina diária. Especialmente, trocar o dia pela noite, e estar ativo e agitado quando já deveria estar dormindo. O fato que uma grande cidade pode funcionar 24 horas por dia, com luz artificial e ruído constante, desequilibra nossos ritmos orgânicos. Muita gente hoje sofre de transtornos do sono e dificuldades de concentração.

Com relação ao excesso de trabalho, uma mistura de exploração capitalista, principalmente das profissões mais mal remuneradas, e de ambição pessoal, dos mais afortunados, contribui para que trabalhemos muito mais do que seria sensato ou necessário. As jornadas de trabalho avançam noite a dentro, nos fins de semana e feriados. E o resultado é a exaustão crônica.

Concluindo

Portanto, vocês já devem ter percebido que a obtenção de longevidade com saúde não depende de uma “pílula mágica”, mas de um conjunto de ajustes no nosso estilo de vida. Certamente, a hereditariedade e uma boa constituição também desempenham um papel aqui. Mas muitas vezes, pessoas com uma constituição mais robusta acabam se cuidando menos e se expondo a riscos e desgastes evitáveis. Enquanto pessoas mais frágeis, mas mais prudentes, podem viver mais com saúde, porque sabem se preservar. O próprio mestre Liu Pailin, aos 90 anos, dizia que sua família não era longeva. Todos os seus parentes haviam morrido por volta dos 50 anos. Sua longevidade com saúde era devida, em larga medida, à prática regular dos treinamentos taoistas e à compreensão dos ciclos naturais.

A definição de saúde da medicina chinesa

Os caracteres chineses acima significam “nutrir a vida”. Esta é uma das definições de saúde na medicina chinesa.
Se preferir acessar a versão em vídeo desta postagem, ela se encontra no canal Longevidade Taoista

Hoje vamos falar da definição de saúde na medicina chinesa. Mas primeiro, vamos explicar o que ela não é.

Nem ausência de doenças, nem completo bem estar

Saúde não equivale à “ausência de doenças”, como na visão biomédica mais convencional. Esta definição indica como, durante muito tempo, a medicina cartesiana foi mais uma ciência da doença do que uma ciência da saúde, pois não manteve o foco no que caracteriza um organismo como saudável, nem como preservar essa condição. Em vez disso, representava-se por meio de uma linguagem de “guerra contra a doença”, principalmente as doenças contagiosas. Nos últimos cem anos, houve uma certa redução das doenças infecciosas como causa de morte. Ao mesmo tempo, predominam as doenças crônicas, metabólicas e degenerativas. Por isso, a medicina convencional tem sido forçada a rever este ponto de vista.

Outra definição, elaborada pela OMS, descreve saúde como um “estado de perfeito bem estar físico, mental e social”. Embora mais ampla e positiva, esta definição tem sido questionada por separar conceitualmente o que é inseparável na vida. Pois, ninguém é só corpo, só mente ou só membro de uma sociedade. Somos tudo isso ao mesmo tempo. E, além disso, essa definição é excessivamente idealizada. Afinal, em que situação no mundo real poderíamos estar por muito tempo em um estado de “perfeito bem estar”? Isso se parece mais com o paraíso dos monoteístas, o nirvana dos budistas, os reinos dos imortais taoistas, ou uma experiência de êxtase religioso ou erótico. Mas não é algo viável o tempo todo.

Saúde segundo a medicina chinesa

Para a medicina chinesa, saúde é autorregulação e equilíbrio dinâmico do nosso organismo. Nosso corpo está constantemente fazendo o que é necessário para viver: respiração, circulação sanguínea, digestão, metabolismo, movimento voluntário, processamento cognitivo, sensorial e afetivo, etc.

Quando tudo funciona adequadamente, temos a capacidade de nos autorregular em relação a variações climáticas, calor, frio, vento, secura e umidade. Nosso sistema imunológico responde à invasão de agentes patogênicos. O corpo desempenha suas funções necessárias à vida de modo eficiente. Sentimos emoções ao passar pelos acontecimentos da vida, mas sem perder a cabeça e sem nos fixar neste ou naquele acontecimento. As coisas passam e nos adaptamos às mudanças da vida.

Na linguagem da medicina chinesa, saúde é equilíbrio de Yin e Yang e dos Cinco Elementos. Isso se traduz como equilíbrio funcional, plenitude da vitalidade e equilíbrio emocional.

Assim, uma pessoa saudável pode vir a se machucar ou adoecer, mas seu organismo tem suficientes recursos e capacidade de autorregulação para se recuperar destas situações. Os ferimentos cicatrizam e ela se cura das infecções. Ela respira, digere, movimenta-se e dorme bem. Não tem doenças crônicas, ou pelo menos elas estão controladas, sem crises frequentes. É capaz de manter relações sociais sadias e manejar os conflitos inevitáveis. Suas faculdades mentais estão plena e ela mantém o equilíbrio emocional em situações adversas.

Nutrir a vida

E para expressar que saúde é uma capacidade que se cultiva, uma das expressões em chinês para saúde é “nutrir a vida” (養生 yǎng shēng). E para que todas nossas funções orgânicas e faculdades mentais funcionem na sua plenitude, a civilização chinesa desenvolveu todo um repertório de práticas corporais para favorecer a preservação da saúde e a obtenção de uma longevidade saudável. Produziu também uma atenção global ao estilo de vida, considerando alimentação, exercício e qualidade do sono como bases para a saúde. E outro ponto importante é o devido equilíbrio entre repouso e atividade, outra forma de falar do equilíbrio de Yin e Yang. Veremos este tripé da saúde em uma outra postagem.

Medicina Chinesa e Taoismo

Em chinês: à esquerda, medicina chinesa. À direita, taoismo.

Você é uma das pessoas que se pergunta se a medicina chinesa tem alguma relação com o taoismo? E, se responde que sim, sabe qual seria essa relação? É isto que pretendo responder nesta postagem.

Medicina chinesa, religião e espiritualidade

Será que a medicina chinesa é uma religião ou uma prática espiritual? Obviamente não. Na verdade, ela é um saber médico tradicional. Quer dizer, um conhecimento sobre saúde e doença. Por isso, não é preciso ser religioso ou ter um caminho espiritual para praticar medicina chinesa. Basta ter uma formação adequada na sua teoria e prática. E, para ser paciente dela, basta querer receber seus cuidados de saúde. Não é importante se você é religioso ou ateu, o efeito da medicina chinesa será o mesmo.

Por outro lado, historicamente, na China, houve monges taoistas e budistas que aprenderam e praticaram medicina. Isso fez parte de sua formação e de suas atividades em benefício da comunidade. Saber medicina chinesa é um ofício, um meio de ganhar o próprio sustento. E também é uma oportunidade para servir aos demais e aliviar seu sofrimento.

Em particular, como o taoismo é nativo da China, em certos contextos e momentos históricos houve um importante intercâmbio com a medicina chinesa. Explicarei isso, daqui a pouco.

E o taoismo, é uma religião?

O taoismo é uma religião? Sim e não, depende do que definimos como taoismo e como religião. Em primeiro lugar, o próprio conceito de religião é um tanto problemático para caracterizar as espiritualidades tradicionais asiáticas porque foi elaborado por estudiosos ocidentais que tinham como modelo as instituições, símbolos e práticas das religiões monoteístas.

Por um lado, uma estudiosa importante como Robinet (1997) afirma que a oposição entre taoismo filosófico e religioso foi uma invenção ocidental. Outra autora relevante, Kohn (2001), define taoismo como a religião originária da China antiga. Mas mesmo assim, também é preciso diferenciar o taoismo da religião popular chinesa, que se relacionam, mas não se confundem, como explicou Schipper, (1993).

Por outro lado, meu primeiro mestre taoista, Liu Pailin, enfatizou que seus ensinamentos representavam “a essência da civilização chinesa” e que “não tinham nenhuma conotação religiosa”. Ele não ensinou um taoismo sacerdotal, de divindades, templos e rituais. Em vez disso, sua linhagem combinava três pilares: medicina ( 醫), arte marcial (quán 拳) e o caminho da iluminação (xiān 仙). E falava de uma espiritualidade que emerge da apreciação dos segredos da natureza e que se manifesta como nosso potencial inato de conexão com o Tao, o estado natural. De modo semelhante, a linhagem taoista Kunlun Xianzong (kūnlún xiānzōng 崑崙仙宗 ), de que sou discípulo, define-se como prática do Tao (dàogōng 道功) e não como religião taoista (dàojiào 道教).

Relações entre medicina chinesa e taoismo

Então, qual a relação entre medicina chinesa e taoismo? De fato, são vários os pontos de conexão. Taoismo e medicina são dois campos distintos, mas que tiveram trocas frutíferas.

Em primeiro lugar, a filosofia que informa a compreensão médica da natureza, do corpo humano e da própria vida é de base taoista. A natureza é vista como um fluxo de alternâncias e combinações de Yin e Yang e do Qi dos Cinco Movimentos. O corpo humano é entendido como um pequeno universo, regido e formado pelas mesmas forças que a grande natureza.

Como vimos, os fundamentos da medicina chinesa são os mesmos de todos conhecimentos tradicionais chineses: a filosofia Yin e Yang e a teoria dos Cinco Movimentos. Assim, a cosmologia taoista oferece a linguagem para os fundamentos da medicina chinesa. Os ciclos naturais, os processos fisiológicos, a saúde e a doença, tudo isto é descrito com o simbolismo de Yin e Yang e dos Cinco Movimentos.

Outro ponto é que as práticas taoistas de longevidade, como os exercícios de meditação, Daoyin e Qigong, foram incorporadas ao repertório da medicina chinesa, como prevenção e tratamento.

Além disso, as pesquisas da alquimia taoista  também descobriram algumas substâncias consideradas remédios superiores que favorecem a longevidade. Posteriormente, foram incorporadas à farmacopeia chinesa, como o cogumelo Lingzhi (靈芝 língzhī, nome científico, Ganoderma lucidum) , a raiz Huangqi (黃耆 huángqí, nome científico, Astragalus membranaceus), a famosa fruta gojiberry (枸杞子 gǒuqǐzǐ, nome científico, Lycium barbarum), entre outros.

Paralelamente, o conhecimento médico informou o desenvolvimento das práticas taoistas. A elaboração dos exercícios para longevidade, das técnicas de alquimia interior, entre outras, beneficiou-se bastante do conhecimento médico. De fato, muitos exercícios de Qigong populares hoje em dia, como a série do Baduanjin (八段錦 bāduànjīn), demonstram que seus criadores possuíam uma compreensão profunda da medicina chinesa.

Para concluir: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Mas isso não quer dizer que quem pratica medicina chinesa seja taoista. Como disse antes, a medicina chinesa é um conhecimento médico tradicional, voltado para nutrir e prolongar a vida, independente de religião ou espiritualidade.

E, além disso, nem toda pessoa que se considera taoista é especialista em medicina chinesa. Nas linhagens que pratico, este é um estudo considerado importante. Juntamente com outras artes tradicionais. Mas o que define ser taoista é receber os ensinamentos sobre um caminho de vida voltado realização do estado natural, o Tao. E reconhecer em Laozi (老子) o primeiro mestre do Tao.

Breve introdução à medicina chinesa

zhongyi, medicina chinesa.
Se preferir, assista o vídeo com este conteúdo no canal @longevidadetaoista do Youtube

Neste artigo, apresento uma breve introdução à medicina chinesa (中醫 Zhōngyī), tradição milenar reconhecida como um dos grandes sistemas médicos mundiais. A medicina chinesa é uma tradição antiga.  Surgida há aproximadamente 4500 anos, com mais de 3770 anos de história documentada. Possui um vasto repertório de teorias, métodos diagnósticos e terapêuticas, além de milênios de experiência clínica acumulada.

Seu objetivo original é prolongar e nutrir a vida. Isto está expresso nos textos clássicos. Portanto, seu foco está na saúde e na longevidade, mais do que na doença. Isto é importante para compreender corretamente o seu enfoque.

Sobre os clássicos

Nesta breve introdução à medicina chinesa, vamos começar falando dos seus clássicos. Pois ela tem uma bibliografia muito vasta. Vejam que, só para dar uma ideia de sua antiguidade, seus dois principais clássicos ainda em uso, o Clássico Interno do Imperador Amarelo (Huángdìnèijīng 黃帝內經) e o Clássico das Dificuldades (Nànjīng 難經), datam pelo menos da dinastia Han. Ambos foram escritos sob a forma de um diálogo, com perguntas e respostas.

O Clássico Interno do Imperador Amarelo (Huángdìnèijīng 黃帝內經) é atribuído ao lendário Huangdi, um dos fundadores da civilização chinesa, que teria vivido por volta de 2600 a.C. O livro é formado por dois volumes, Questões Simples e Eixo Espiritual, que traz suas conversações com seu conselheiro médico, Qibo. A edição que chegou aos dias de hoje é baseada na edição de Wang Bing, de 762 d.C., durante a dinastia Tang.

O Clássico das Dificuldades (Nànjīng 難經) é atribuído a Bian Que, médico famoso do período dos Reinos Combatentes, dotado de habilidades de diagnóstico quase sobrenaturais. Além disso, ele é também um importante precursor da pediatria chinesa.

Mas, apesar da sua antiguidade, são considerados tão profundos que praticantes contemporâneos de medicina chinesa continuam a estudá-los até hoje, juntamente com os manuais modernos.

A racionalidade médica chinesa

Ainda que seja um tema vasto demais para esta breve introdução à medicina chinesa, precisamos falar dele. A medicina chinesa tem uma racionalidade própria. Pois seus dois fundamentos principais são a filosofia Yin-Yang e a teoria dos Cinco Movimentos. Então, falemos deles brevemente. Uma explicação mais detalhada de cada um pode ser tema uma postagem no futuro.

Yin-Yang (陰陽) é a forma mais elementar para classificar todos os fenômenos da vida. Embora muita gente pense que são duas coisas diferentes, na verdade, não podemos separa-las: como os dois lados de uma mesma moeda, ou dois momentos de um mesmo processo. Ao mesmo tempo, eles se completam, se alternam e se opõem.

Os Cinco Movimentos (五行) são uma maneira parecida, mas mais diversificada de falar da mesma coisa. Eles são Madeira (木), Fogo (火), Terra (土), Metal (金) e Água (水). Dentro de cada um dos Movimentos, existem aspectos Yin e Yang. Mas também relativamente uns aos outros, há Movimentos mais Yin ou mais Yang.

Todo o restante da teoria médica chinesa, a teoria dos órgãos internos; o sistema de canais e colaterais; etiologia e patologia; bem como os métodos de diagnóstico e de tratamento, são aplicações destes dois fundamentos. Por isso, podemos dizer que, para entender a medicina chinesa, precisamos entender Yin-Yang e Cinco Movimentos.

Métodos terapêuticos

Nesta breve introdução à medicina chinesa, vamos listar e descrever rapidamente os seus métodos. São eles: acupuntura, moxabustão, ventosaterapia, guasha, massagem Tuiná, dietoterapia, fitoterapia, exercícios, etc.

Certamente, a acupuntura é o método mais famoso. Quase todo mundo já ouviu falar de inserir agulhas no corpo para tratar doenças. Mas nem todo mundo sabe que isto é feito de forma precisa. Coloca-se as agulhas em locais e trajetos específicos, segundo um conhecimento sistemático do corpo e do efeito das agulhas em seu funcionamento. Elas tem formato e espessura especiais, mais finas que agulhas de injeção ou de tatuagem.

Moxabustão é a aplicação de calor sobre diferentes pontos, por meio da queima da “lã” de artemísia. Ela é moldada em bastões, bolas, cones ou grãos, segundo a necessidade. Além de gerar calor, a planta tem também propriedades medicinais.

Vamos falar dos métodos restantes mais brevemente. As ventosas são copos de chifre, bambu, porcelana, vidro ou, atualmente, plástico, que produzem sucção e estimulam a circulação sanguínea. Guasha é uma espátula, originalmente feita de chifre, usada para raspar a pele. A massagem Tuiná usa várias técnicas de terapia manual, pressionando pontos, mas também deslizando, friccionando, golpeando e pressionando diversas áreas do corpo. Há também o uso da alimentação como remédio, baseada na compreensão da natureza da doença e na constituição do paciente. A medicina chinesa tem também fitoterapia. Suas fórmulas combinam plantas medicinais, ingredientes de origem animal e mineral, para uso interno ou externo, de acordo com a condição do paciente.

E por fim, existe também um amplo repertório de exercícios terapêuticos, utilizados para preservar a saúde, prevenir e tratar doenças e prolongar a duração da vida: Qigong, Daoyin, Taijiquan, etc. Utiliza-se inclusive a meditação, normalmente entendida como prática espiritual. Afinal, a calma e o equilíbrio emocional são importante fator de saúde.

Concluindo…

Concluindo esta breve introdução à medicina chinesa, retomo o último ponto acima, para destacar a visão integral de saúde que a caracteriza. A medicina chinesa está atenta, ao mesmo tempo, ao bom funcionamento do corpo, ao equilíbrio emocional e à lucidez da consciência. Junto com outras medicinas tradicionais, ela foi pioneira em reconhecer a unidade mente-corpo e sua importância para saúde. Agitação mental e emoções muito intensas são causa possível de doença. Inclusive, o estado mental é um elemento importante no prognóstico sobre sucesso do tratamento.

Além disso, a medicina chinesa não se preocupa só com o tratamento das doenças, ela age preventivamente. Por causa disso, parte do seu trabalho é orientar sobre dieta, sono, exercício e estilo de vida. Isso evita o agravamento de doenças já presentes e o surgimento de doenças evitáveis, além de auxiliar no tratamento.

Ela é praticada atualmente em mais de 180 países em todo o mundo.